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Regras da ANS colocam na UTI sistema de autogestão

19/02/2016

Órgãos de controle do governo vêm impondo uma série de normas que podem inviabilizar a atuação de cerca de 130 operadoras de planos de saúde sem fins lucrativos, como a Geap Autogestão em Saúde

Escrito por: Vagner Freitas, presidente Nacional da CUT • Publicado em: 16/02/2016 - 14:52 • Última modificação: 16/02/2016 - 15:06

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Roberto Parizotti

Os órgãos de controle do governo vêm impondo uma série de normas que podem inviabilizar a atuação de cerca de 130 operadoras de planos de saúde sem fins lucrativos, que atendem milhares de beneficiários em todo o Brasil, entre eles cerca de cinco milhões de servidores públicos.

Uma das obrigações estabelecidas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que pode comprometer severamente os planos de saúde  autogeridos, é a constituição de reservas técnicas mensais calculadas de acordo com fluxo de guias faturadas referentes aos servidos prestados aos assistidos.

Estamos falando tanto de operadoras de pequeno e médio porte, com até três mil beneficiários, quanto de carteiras com mais de 100 mil beneficiários, como a da Cassi (Banco do Brasil), Postal Saúde (Correios), FioSaúde (Fundação Oswaldo Cruz), Capesesp (Fundação Nacional de Saúde), Assefaz (ministério da Fazenda) e Geap Autogestão em Saúde (ministérios da Saúde, do Planejamento, Orçamento e Gestão e Instituto Nacional do Seguro Social, Dataprev, entre outros) – essas duas últimas sob forte pressão da agência reguladora, em processo de direção fiscal.

Essas operadoras são obrigadas a elevar absurdamente os valores das suas mensalidades para conseguir custear o atendimento aos beneficiários e, ao mesmo tempo, constituir as reservas técnicas legais. A Geap, por exemplo, precisou reajustar suas mensalidades em 37,55% a partir de 1º de fevereiro -  14% do aumento corresponde ao aporte necessário para garantir o provisionamento.

A reserva técnica causa ainda prejuízos à atenção prestada aos beneficiários da saúde suplementar. Ao ter que aplicar um valor muito alto no sistema financeiro, a ANS acaba por priorizar a proteção financeira em detrimento de estratégias que podem melhorar a qualidade de vida do beneficiário. Para atender essa demanda, deixa-se de investir na prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão e diabetes, e em outros programas de atenção básica à saúde, que fazem parte da missão do sistema de autogestão e são preconizados pela própria agência reguladora.

O que está em debate não é a constituição de uma reserva em si – prática importante para a garantia de atendimento em casos de falência das operadoras. É fundamental, no entanto, rediscutir os critérios de controle das empresas sem fins lucrativos. O provisionamento exigido de planos de saúde que visam o lucro não pode ser semelhante ao dos autogeridos, que reinvestem tudo o que arrecadam em saúde.

No Brasil, cerca de cinco milhões de servidores públicos utilizam planos de saúde sem fins lucrativos. A gestão dos recursos, que são devidamente auditados, é transparente. Além de contribuírem financeiramente com a operadora de saúde, os beneficiários das autogestões participam de decisões estratégicas sobre a organização administrativa da instituição e exercem controle social, por meio de representantes eleitos para participar dos conselhos de administração das operadoras. A composição desses colegiados agrega representantes de entidades sindicais dos servidores públicos e de órgãos que patrocinam a autogestão.

Na relação entre os assistidos e a operadora de autogestão, não há intermediação de corretores e os beneficiários pagam apenas pelos serviços realmente utilizados, o que torna os custos de manutenção menores que os planos comerciais de assistência à saúde.

É claro que operadoras que não têm uma gestão séria e comprometida com os interesses de seus beneficiários podem ser liquidadas e chegar à falência. No entanto, existem diversos mecanismos de controle e formas de monitorar essas operadoras, sem necessariamente exigir uma reserva em patamares tão elevados.

O que os órgãos de controle não conseguem ou não querem enxergar é que os planos lucrativos estão concentrados nas grandes metrópoles e nas cidades ricas do interior de alguns estados. Já os autogeridos estão presentes nas regiões mais remotas, como é o caso da Postal Saúde, da Geap e da Capesesp, que atuam no modelo de atenção por níveis de complexidade, com acompanhamento sistêmico. Essas operadoras oferecem aos seus beneficiários desde programas de atenção básica domiciliar, passando pelo atendimento em clínicas e chegando à internação, nos casos que demandam atenção hospitalar e cirurgias.

É um cuidado mais próximo, um olhar direcionado para o perfil dos beneficiários dos planos de saúde. E essa tarefa envolve equipes interdisciplinares – formadas por médicos, fisioterapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos, nutricionistas, dentistas, entre outros – que vão ao encontro dos assistidos até mesmo nos locais de trabalho.

E, ao contrário dos planos de saúde lucrativos que evitam a adesão de idosos por causa dos custos, os planos de autogestão sérios e comprometidos conseguem prestar bons serviços independentemente da idade do seu público – 60% da carteira da Geap é formada por pessoas com mais de 50 anos de idade. 

Todas essas variáveis e especificidades, muito mais importantes do que um fundo monetário, precisam ser consideradas ao se estabelecer regras e exigências de acompanhamento e controle desses planos. A equidade, um dos pilares do Sistema Único de Saúde (SUS), precisa com urgência ser levada em consideração pelos órgãos que regulamentam as autogestões, que exercem um importante papel social, ao complementar a atenção oferecida pela rede pública de saúde com serviços de qualidade a preços justos. 


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